Aprendemos na escola que a escravatura foi abolida no Brasil em 1888. Entretanto, o país continua registrando casos de pessoas em regime de trabalho análogo à escravidão. Cabe destacar que o país é signatário das Convenções 105 e 29 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que abordam o tema, tendo se comprometido a abolir toda a forma de trabalho forçado ou obrigatório.
Não custa lembrar que esse é um drama mundial. Conforme relatório divulgado em setembro do ano passado pela OIT, cerca de 28 milhões de pessoas foram vítimas de trabalhos forçados em 2021. Um dado trágico é que 3,3 milhões das vítimas (uma a cada oito pessoas) eram crianças.
Afinal, o que define “trabalho análogo à escravidão”? No Brasil, as condições que caracterizam a escravidão moderna estão especificadas no artigo 149 do Código Penal. Entre elas, estão a submissão a trabalho forçado; condições degradantes de trabalho; servidão por dívida; e jornadas exaustivas. A essas situações se pode agregar coações físicas ou morais e violação da dignidade da pessoa. A seguir, explicamos um pouco mais sobre o tema, com o suporte do advogado Humberto Marcial, sócio do escritório Marcial, Pereira & Carvalho (MP&C Advocacia), de Belo Horizonte.
Trabalho análogo à escravidão: Caso das vinícolas gaúchas
No Brasil, um dos casos recentes de maior repercussão foi a localização de 207 homens contratados para trabalhar em condições degradantes na colheita de uvas em Bento Gonçalves (RS). O episódio veio à tona em fevereiro de 2023. A empresa que recrutou as pessoas na Bahia prestava serviços para grandes vinícolas da serra gaúcha, as quais alegaram não ter conhecimento sobre a situação relatada pelos trabalhadores.
Além de cumprirem jornadas exaustivas de 5h às 20h (sem pausa), eles eram obrigados a adquirir produtos básicos com preços superfaturados, o que fazia com que acumulassem dívidas superiores aos salários que recebiam. Nos depoimentos, foram relatados ainda episódios de violência, como surras com cabo de vassoura, mordidas, choques elétricos e ataques com spray de pimenta, além de más condições de trabalho e alojamento.
O caso das vinícolas gaúchas não foi o único a ganhar evidência nos primeiros meses de 2023. Em todo o Brasil, já foram registradas 523 vítimas de trabalho análogo à escravidão neste ano, de acordo com dados do Ministério do Trabalho e Emprego. Entre elas, estão 82 – incluindo 11 adolescentes – localizadas em duas fazendas de arroz em Uruguaiana, na fronteira oeste do Rio Grande do Sul, e outras 32 da cadeia de produção de cana de açúcar na região noroeste do estado de São Paulo.
Punições para trabalho análogo à escravidão: o que diz a legislação?
O Código Penal estipula uma pena de dois a oito anos de prisão, além de multa, para quem submeter outras pessoas a trabalho análogo à escravidão. A pena é aumentada em 50% se o crime for cometido contra crianças ou adolescentes ou ainda por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. Na parte criminal, os crimes devem ser investigados pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, cabendo à Justiça Federal julgá-los.
Por outro lado, a Emenda Constitucional nº 81, de 2014, determinou que as propriedades onde for identificada a exploração de trabalho escravo serão expropriadas e destinadas à reforma urbana ou agrária, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
Na esfera trabalhista, deverão ser restituídos salários atrasados, dias trabalhados, 13º proporcional, aviso prévio indenizado, férias proporcionais, recolhimento de FGTS, multa de 40% do FGTS e outras verbas rescisórias. Caso as pessoas tenham sido trazidas de outras regiões, o empregador deverá providenciar o transporte dos trabalhadores para seus locais de origem. Ele poderá ser obrigado ainda a pagar indenização coletiva, por violar interesse da coletividade (neste caso, o dinheiro será destinado a projetos sociais de órgãos públicos ou instituições sem fins lucrativos).
Cassação do registro em caso de trabalho análogo à escravidão
Outro dado importante é que alguns estados brasileiros (como São Paulo) preveem a cassação do registro de contribuinte de ICMS de empresas que se beneficiam direta ou indiretamente do uso de trabalho escravo, em qualquer etapa da cadeia produtiva. De outra parte, à companhia que se utiliza de condições de trabalho análogas à escravidão também pode ser vedada a concessão de financiamento rural, conforme a Resolução nº 3.876/2010 do Conselho Monetário Nacional (CMN).
Como denunciar a escravidão moderna
A denúncia pode ser feita presencialmente em qualquer unidade do Ministério Público do Trabalho (MPT) ou nas Superintendências Regionais do Trabalho. Pelo telefone, é só ligar para o Disque 100 (canal do governo federal para recebimento de denúncias de violações de direitos humanos). Além disso, o site do MPT disponibiliza um canal para registro de denúncias de crimes que atentem contra os direitos dos trabalhadores.
Dúvidas sobre o tema?
Para maiores informações, entre em contato com nossos escritórios pelo Whatsapp. Utilize os links abaixo:
Paraná: Gasam Advocacia
Minas Gerais: MP&C Advocacia
Demais estados: Clique no ícone do Whatsapp ao lado.
Ou acesse a nossa caixa de mensagens